Volvidos quase um ano sobre a seca, com efeitos nefastos para a economia familiar e para as famílias cabo-verdianas, importa revisitar o programa, fazer o balanço da sua execução, ver o que falhou, ouvir os beneficiários, adequar o programa à realidade do país visando a sua substancial melhoria, para que possa de facto servir, para socorrer as famílias em dificuldades, apoiar no salvamento de gado e de propriedades agrícolas e proteger a economia familiar.
Pelos dados da execução do programa, pudemos constatar que o programa falhou em toda a sua vertente e em todos os seus eixos estratégicos. Ficou claro que:
1- Os vales-cheque de 300$ são insignificantes para apoiar as famílias no salvamento do gado, quando um saco de ração custa 1.480$00 e estas não têm onde arranjar o resto do dinheiro para adquirir a ração;
O PAICV já tinha alertado o Governo que fez ouvidos moucos, ignorando todos os subsídios e propostas apresentados.
2- Até o mês de Março, apenas 6.300 contos foram usados em vales cheque, um valor insignificante e que corresponde a pouco mais de 10% do total dos vales cheque distribuídos;
Como resultado, as famílias perderam grande parte dos seus animais: ou morreram à fome; ou foram abatidos, ou vendidos ao desbarato para recuperar parte da economia familiar.
3- Os Empregos precários, com salário de pouco mais de 200$ ou 300$00 por dia, não ajudam as famílias a levar a panela ao lume, muito menos fazer poupança para ajudar no salvamento do gado, ainda pior quando não são pagos em tempo útil ou são suspensos os trabalhos sem receberem os salários;
Como resultado, há situação de penúria no campo; há um êxodo das famílias do interior para os centros urbanos com todos os seus efeitos; há estudantes a abandonarem as escolas por falta de condições das famílias para pagar as propinas e transporte escolar;
4- Os nossos parceiros de desenvolvimento, através da cooperação internacional, disponibilizaram mais de 1 milhão de contos ao Governo para apoiar, essencialmente, as famílias em dificuldades, mas o resultado é o abandono destas famílias por parte dos poderes públicos, porque os recursos estão sendo geridos sem sensibilidade humana e direcionados para assuntos outros que não o salvamento do gado ou geração de rendimentos para as famílias afetadas.
O programa falhou!
É o próprio governo que após uma grande pressão dos beneficiários, dos parceiros, dos deputados na casa parlamentar e até do Presidente da Assembleia Nacional, vem admitir que o programa falhou, que era desajustado, e que as medidas eram insuficientes, ao ponto de vir anunciar o aumento do valor dos vales cheque, ainda que muito insuficiente, tendo em conta as reais necessidades dos criadores.
Uma das maiores evidências de que o programa foi um fracasso total é o facto do governo ter distribuído mais de 215 mil vales cheque… e pouco mais de10% foi utilizado. Mas não é que as pessoas não queiram usar os vales cheque….As pessoas não podem! Ou porque não tem rendimentos para completar o valor total de um saco de ração ou porque não encontram a ração subsidiada para comprar. Entenda isso Sr. Ministro! Caso contrário as novas políticas falharão de novo.
Veja! O seu recente anúncio, diga-se tardio, que vão aumentar o valor dos vales cheque é o reconhecimento de que a medida falhou. Este aumento vai manter a situação na mesma porque a grande verdade é que as pessoas continuam a não ter a outra parte, diga-se dinheiro, para comprarem a ração.
Entenda isso!
Também a medida de trabalho rotativo e quinzenal não esta resolvendo e nem resolverá os problemas das famílias.
Temos que arrepiar caminho, mudar completamente o programa e poder dar assim uma resposta que os agricultores, criadores de gado e homens do campo esperam e aguardam ansiosamente.
A situação que se vive no interior de São Nicolau, no interior de Santiago, na Ilha do Maio, em Santo Antão, no Fogo, na Brava e um pouco por todo o país é, de facto, preocupante e exige atenção especial de todos, mas particularmente do Governo. Há situações de famílias que não têm nada para comer.
Essa é a realidade nua e crua de algumas famílias no mundo rural.
E isso é preocupante! O futuro e a felicidade prometidos aos cabo-verdianos não serão alcançados dessa forma Senhor Ministro. Cabo Verde quer um Governo que tenha a capacidade de trabalhar para o seu futuro e que ouça os contributos da oposição e, em especial, os trazidos aqui na introdução desta interpelação, na voz da Lider Parlamentar, Dr. Janira H. Almada, para resolver o problema e precaver-se para a nova campanha agrícola que se avizinha, nomeadamente:
1- Disponibilização e distribuição de sementes aos agricultores;
2- Introdução do Milho na lista dos produtos subsidiados aos agricultores e criadores de gado;
3- Redução (pelo menos enquanto durar os efeitos da seca e do mau ano agrícola) do preço da água para agricultura e suspensão da cobrança do IVA sobre a água utilizada na agricultura e abeberamento de animais;
4- Distribuição de ração, gratuita, aos criadores de gado e às famílias em situações de extrema dificuldade e vulnerabilidade;
5- Apoio social sob a forma de isenção de propinas e das taxas de matrícula aos alunos oriundos das famílias afetadas pelo mau ano agrícola;
6- Garantir trabalho digno e permanente às famílias afetadas no mundo rural como forma de mitigar os efeitos da seca e mau ano agrícola e não mante-las na situação de rotatividade atual e com salários precários de 200/300$;
7- Programar e retomar a introdução de gado de raça melhorada como forma de minimizar as perdas havidas ao longo do ano e que contribuíram para diminuição substantiva dos efetivos e a destruição da economia familiar;
8- Alargamento do prazo para amortização dos empréstimos contraídos no âmbito da linha de microcrédito disponibilizado.
Enfim, reiteramos, pois, as nossas preocupações face à situação e deixamos aqui a nossa disponibilidade para contribuir para que as melhores soluções sejam encontradas, num domínio e num sector fundamental para a nossa economia e para o combate à pobreza e reforço da coesão social.
Nuias da Silva - Deputado Eleito pelo Circulo Eleitoral do Fogo e Vice-Presidente do GP PAICV