Nos últimos dias circularam, nos meios de comunicação social e nas redes sociais, informações de que Cabo Verde teria declarado apoio, incondicional e em qualquer circunstância, a Israel em sede das Nações Unidas.
Tal informação causou indignação geral e diversas recções de repúdio, de várias personalidades que sempre acreditaram no bom senso, na maturidade e na prudência de Cabo Verde, em matéria de diplomacia e política externa.
Apesar da questão ser baseada num post do Primeiro-Ministro de Israel, Netanyahu, no Twitter, o PAICV não reagiu antes, primeiro por não dar credibilidade à notícia, segundo por aguardar, pacientemente, a reação das autoridades nacionais.
Com efeito, uma decisão desta natureza, para além de ligeira, descredibilizaria a nossa diplomacia, considerada internacionalmente como inteligente, pragmática, autónoma e promotora dos superiores interesses de Cabo Verde.
As reações tardias das autoridades nacionais fizeram acreditar que este fumo deveria estar a ser alimentado por um fogo real, embora camuflado e escondido dos cabo-verdianos.
A reação do Senhor Presidente da República, embora tardia, veio pelo menos tranquilizar os espíritos dos cidadãos destas ilhas, com o desmentido do seu envolvimento nesta novela, que fez correr muita tinta e colocou Cabo Verde na boca do mundo pelas piores razões.
A reação do Senhor Presidente da República não deixa de ser, também, sintomática porque veio, praticamente e, também, publicamente considerar de falsas as afirmações do Primeiro-Ministro de um país que, até há poucos dias, se tornara dono de uma importante dimensão de soberania de Cabo Verde.
Este desmentido à afirmação do Primeiro-Ministro de Israel, se, por um lado, nos tranquiliza a todos, por outro lado, poderá ter criado e aberto um incidente com este país que, à luz desta afirmação, está a ser liderado por alguém que lida mal com a verdade.
O Senhor Presidente da República para além de retirar o seu corpo, de mansinho, desta tempestade, lavou as suas mãos e passou a bola ao Governo de Cabo Verde, que é responsável, à luz da Constituição da República, pela política externa.
Caso para se dizer: NOVOS TEMPOS ou cómoda conveniência!
Mas o Governo, para a surpresa de todos, ao invés de assumir, de imediato e sem titubear, que não tinha nada a ver com este dossier e que se trata de uma inverdade, optou por atacar a todos que reagiram com indignação a esta decisão e, para não variar, dirigindo-se com fúria em relação ao PAICV, que parece ser eleito inimigo de estimação e saco de pancada do partido no Poder.
De notar que o Governo reagiu, primeiramente, através de um comunicado, sem cara, onde não diz que sim, nem que não, mas se atira aos outros, eleitos culpados deste imbróglio, numa questão aparentemente fácil onde poderia dizer que tudo não tinha passado de um tremendo equívoco ou de um deslize diplomático.
O comunicado do Governo, assumindo particamente a posição de apoio a Israel, não fez mais do que uma tentativa de desvio da atenção do essencial, de uma descarada desresponsabilização, de retirar o foco da questão do Governo e de responsabilizar os outros, sempre os outros.
Hoje, depois de esgotados os mecanismos de fuga aos jornalistas, depois do desastroso comunicado, aparece o Ministro dos Negócios Estrangeiros para nos dizer que afinal não há compromisso nenhum e que Cabo Verde continua a ter voz própria e a respeitar as decisões das Nações Unidas.
O desmentido de hoje fica, contudo, ensombrado com o comunicado de ontem que ofende, injustificadamente, as pessoas, chamando-as de “desavisados e boiada de serviço”, poupando, contudo, o “touro internacional” que despoletou esta espécie de hecatombe diplomática.
Quem precisa ofender os outros, desta forma, para desmentir um facto simples, demonstra, no mínimo, não estar de consciência tranquila e ter escondido algo que não quer compartilhar com os cabo-verdianos.
Neste cartório da consciência dos nossos governantes parece existir muita culpa encapotada e difícil de disfarçar.
Pelo meio fica o desmentido ao Secretário-Geral do MPD, que parece dessintonizado do Governo e do Embaixador que se revela dessincronizado com as diretivas diplomáticas do país.
Aliás, em matéria diplomática e de política externa o país parece andar à deriva. São episódios demais de desarticulação, de desencontros e de desacertos para um curto período de governação.
Não se acertou na substituição apressada, precipitada e irresponsável dos diplomatas, não se acertou na questão da isenção unilateral de vistos, não se acertou com relação às polémicas declarações do Ministro da Cultura sobre um outro país membro da CPLP, não se acertou com relação a indicação de embaixadores políticos que pareceu, aos olhos de todos, mais como um prémio de que a priorização dos interesses nacionais.
Para o PAICV a diplomacia e a Política Externa de Cabo Verde exige responsabilidade, maturidade, bom senso, dignidade e coerência para se continuar a investir nas bases da construção de confiança e a sedimentar e preservar as conquistas no capital de credibilidade.
Para o PAICV a esfera da política externa deve continuar a ser um eixo estratégico consensual para alavancar o desenvolvimento sustentável de Cabo Verde baseado sempre na independência de pensamento, na coerência dos princípios constitucionais, no pragmatismo, na estabilidade e na defesa dos superiores interesses desta Nação Global.
Muito obrigado!
Praia, 11 de Agosto de 2017.
Vice-Presidente – Rui Semedo