Não foi positivo porque registamos, com preocupação, alguma regressão da nossa democracia, mesmo na Casa Parlamentar, onde se registaram actos que podem ser enquadrados na tentativa de condicionar e silenciar a Oposição.
Foram violados o Regimento da Assembleia e as Leis da República, foi retirada, indevidamente e múltiplas vezes, palavra aos Deputados, foram feitas ameaças até de ilegalização do Partido (por parte de Deputados mais entusiastas de uma democracia a uma só voz) e, para vergonha de todos, protagonizou-se o acto grave de impedir, à força e à margem de toda a Legislação do País, a constituição obrigatória de uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI).
Recorde-se que se tratava de uma CPI de constituição obrigatória, que não estava sujeita à vontade da maioria, contando com a força dos votos da Maioria Parlamentar.
Para além da violação das Leis, violou-se, também, toda uma prática que, durante anos, vem se consolidando e dando conteúdo à democracia, que funciona numa dinâmica permanente de situação e da oposição, e em que a sua qualidade é avaliada pelos direitos que se confere à Oposição.
O próprio Presidente da República, ciente da gravidade da situação, na sua mensagem de 5 de Julho, chamou atenção para o respeito das Minorias, numa clara advertência e condenação à saga predatória da Maioria.
Da parte do Governo registamos, também, sinais perigosos, como bem ilustram os atentados contra a liberdade de imprensa, o condicionamento dos jornalistas, a tentativa de manipular e instrumentalizar os órgãos públicos de comunicação social, bem como a interferência directa do ministro que tutela o sector.
Continua a saga da partidarização do aparelho do Estado, pondo completamente de lado os cidadãos, violando os direitos de acesso transparente, em condições de igualdade e por mérito, aos cargos na administração pública, privilegiando a regra da nomeação de confiança político-partidária, o que vem impossibilitando os jovens quadros qualificados de acederem a cargos de responsabilidade na função pública, para contribuírem, assim, para o desenvolvimento do país.
O Governo também, incompreensivelmente, recusa o diálogo, esconde e sonega informações, não responde às correspondências remetidas pela Oposição e intervém em sectores estratégicos à margem da Lei e sem se acautelar devidamente os interesses nacionais.
Não se pode perder de vista que este é o ano da liquidação dos TACV que, durante anos, ligou as ilhas entre si e com o mundo.
Assistimos à substituição dos TACV pela transportadora aérea Binter, sem que, como recomenda a ética e a transparência, se conheçam os meandros do negócio, quanto vai custar ao erário público, quais são os interesses nacionais salvaguardados, etc.
Demos conta, no Boletim Oficial nº 46 – I Série, de 3 do corrente, de uma lista de 22 empresas a serem privatizadas, sem que haja indicações sobre o caderno de encargos e, mais preocupante, como ficarão salvaguardados interesses públicos que não são do foro da responsabilidade privada. Sobre esta matéria, o PAICV tomará uma posição pública nos próximos dias.
Com relação à diplomacia o Governo parece meio perdido, falando a várias vozes, interferindo ou se imiscuindo nas políticas de outros países, para além de tomar decisões avulsas, fora de uma estratégia consequente, sem diálogo interno, e sem colocar na balança os interesses do país.
Temos a questão de isenção dos vistos, temos os incidentes com a Guiné Equatorial, temos as transferências sumárias dos Embaixadores e o abandono injustificável de postos e representações consulares, por mais de um ano, com consequências imprevisíveis.
A agravar temos as últimas questões trazidas a público de forma atabalhoada, sobre mudanças profundas na praxis diplomática do País, onde, com seriedade, deve haver linhas de conduta harmonizadas, sobretudo quando se mexe com fundamentos da soberania nacional, bem como com interesses e compromissos com países e organizações internacionais, nossos parceiros da maior valia, para o nosso processo de desenvolvimento.
Nesses, em si graves, aguardamos o desmentido ou a confirmação por parte do Governo e o posicionamento do Senhor Presidente da República, para tomarmos uma posição pública sobre este delicado dossier, que poderá escrever um novo futuro para estas ilhas.
O PAICV acompanha, ainda, com muita preocupação o desempenho do Governação noutras áreas.
Na verdade começam a ficar defraudadas as expetativas criadas durante a campanha eleitoral, no Programa do Governo e nos dois Orçamentos do Estado já aprovados. Já deveria haver sinais de que, afinal, os compromissos que o MPD fez com os cabo-verdianos eram para valer.
De uma tendência decrescente da taxa do desemprego nos últimos três anos, vimos, com apreensão, que o desemprego subiu de 12,4% em 2015, para 15%, em 2016. Um aumento do desemprego jovem que subiu de 28 para 41% e um aumento do desemprego das mulheres que aumento de 10 para 17%, além de passarmos a ter mais desemprego nos principais centros urbanos, como Praia, São Vicente e Assomada.
Para agravar ainda mais a situação os cabo-verdianos se ouvem, frequentemente, anúncios de despedimentos, e, só para citar alguns casos, de 357 trabalhadores no Serviço Autónomo de Águas de Santiago, ao despedimento de dezenas de funcionários das Câmaras Municipais, e estão na eminência de engrossar essas fileiras, cerca de 300 trabalhadores dos TACV, além de milhares de trabalhadores que vão ser apanhados pela onda de privatizações de 23 empresas, já anunciadas pelo Governo.
Temos mais dívida pública, que passou de 122% para 131%;
Temos mais dívida interna, que passou de 28% para 32%, ultrapassando limites impostos por lei.
Temos mais gastos públicos, sobretudo em viagens, workshops e compra de carros novos;
Temos menos investimento público, cuja taxa de execução, até Junho, era de 21%;
Temos o aumento de custo de vida, com o aumento da inflação (em 2.8% em Junho), provocado pelo aumento dos preços de luz, água e bens de primeira necessidade;
Temos um Governo que já inverteu a tendência de redução do desemprego, inverteu a tendência do crescimento das exportações e arrisca-se a inverter a tendência de crescimento económico encontrado, quando entrou no poder em Abril de 2016.
Temos um país governado por um Partido marcada e preocupantemente insensível às questões sociais, que está a destruir as políticas de impacto social, de pensamento mercantilista e de curto prazo, que já acabou com o programa casa para todos, que foi pela via mais fácil de reestruturar do Novo Banco e da liquidação dos TACV, que vai colocar no desemprego centenas de trabalhadores.
Para o PAICV foi um ano de muitos desafios, para a sua organização interna, para a estruturação de uma Oposição articulada, responsável, democrática e sensível aos problemas, aspirações e expectativas dos cabo-verdianos, no País e na Diáspora.
Na sequência das eleições que tiveram lugar no País, viu-se obrigado a realizar novas eleições internas para a relegitimação da liderança e dos órgãos nacionais e, neste âmbito, teve lugar o último Congresso que confirmou a liderança de Janira Hopffer Almada, que tinha acabado de ser relegitimada por mais de 60% de participação do eleitorado do Partido e com cerca de 97% de votos, favoravelmente, expressos.
O XV Congresso foi, sem dúvida, um dos momentos altos do Partido, no ano político findo, elegeu um novo Conselho Nacional e contou com a presença de ilustres convidados de vários partidos de países amigos, oriundos de Portugal, Angola, Guiné-Bissau, Senegal, etc.
Em cumprimento das decisões do Congresso temos vindo a trabalhar, afincadamente, na reorganização do Partido, a começar pela renovação dos órgãos de nível regional, sectorial e de Base, e, neste momento, a grande maioria das Comissões Políticas Regionais e os Sectores já está renovada e em funções, faltando apenas alguns, cujo processo deverá ser concluído ainda antes da Rentrée Política.
O Plano de Atividades e o Orçamento do Partido estão aprovados, bem como um plano de formação nacional, em vias de implementação, para acudir, também, a uma das principais recomendações saídas do XV Congresso.
Ou seja, a casa já está arrumada para a materialização dos desafios do Partido, no sentido de ser uma Oposição forte, pujante e construtiva, em prol de Cabo Verde.
Do ponto de vista político toda a orientação vai no sentido de haver um forte engajamento dos eleitos do PAICV em torno das Câmaras e Assembleias Municipais para cumprirem da melhor forma, na situação ou na oposição, a função de que foram investidos.
O PAICV, enquanto um dos pilares da nossa edificação democrática, considera fundamental ter uma organização forte, para participar na construção e desenvolvimento de Cabo Verte e contribuir para o fortalecimento e consolidação da democracia.
Muito obrigado!
O Secretário-Geral do PAICV – Julião Varela