ABERTURA DA INTERPELAÇÃO SOBRE A DEMOCRACIA E TRANSPARÊNCIA

Completamos um ano da posse dos Deputados, do início do funcionamento do Parlamento e um ano da actividade do actual Governo que tomou posse a 22 de Abril de 2016;
 
1. Um ano pode ser tempo insuficiente para se tirar conclusões definitivas mas é tempo mais de que razoável para quem tem o papel constitucional e a legitimidade, conferida nas urnas pelo povo, para avaliar, para controlar e para fiscalizar, a todo o tempo, a acção do executivo;
 
2. Esta interpelação enquadra-se numa espécie de avaliação permanente e do exercício da pedagogia que tem por missão, neste caso, não esperar que a situação se torne incontrolável e, antes pelo contrário, contribuir para que o seguimento e a avaliação contribuam para corrigir os erros e as falhas, redefinir o rumo e melhorar o desempenho;
 
3. E é por isso que estamos a proceder a esta interpelação sobre a Democracia, indubitavelmente, um ganho da Nação conseguido com a contribuição de todos os cabo-verdianos que, inequivocamente, consideram ser este o caminho para garantir as condições normais para o desenvolvimento destas ilhas;
 
4. A democracia em Cabo Verde está mais de que testada e é hoje de qualidade inquestionável tanto pelo nível de envolvimento dos cidadãos eleitores, como pelo funcionamento das instituições como ainda pelas avaliações que a comunidade internacional e todas as organizações credenciadas nos fazem regularmente;
 
5. Os cabo-verdianos têm todas as razões para se sentirem orgulhosos da qualidade da nossa democracia que conseguiu por de pé, democracia essa cuja robustez é comparada com as mais pujantes a nível mundial;
 
6. Elevamos a nossa prática democrática a um nível tal que faz a nossa democracia emergir como um recurso estratégico, um factor de competitividade e um elemento fundamental na caracterização do país;
 
7. A qualidade da nossa democracia é conferida pelo número de eleições realizadas no país, pelas alternâncias operadas, pelo respeito pelas regras do jogo democrático, pela aceitação dos resultados eleitorais, pela participação dos cidadãos eleitores, pelo envolvimento dos partidos políticos, pela cobertura dos órgãos de comunicação social, pelos debates promovidos, pelo nível das campanhas eleitorais e por muitos outros ingredientes que fazem da nossa democracia uma vivência, uma prática e já uma tradição;
 
8. Sabemos que a democracia não é um ponto de partida e muito menos um ponto de chegada, ela é antes um percurso com pilotagem permanente, com correções regulares, com melhorias infinitas e com flexibilidade para acolher as inovações e os factores de adaptação a circunstâncias diversas para se poder modernizar e garantir um nível de ingerência cada vez mais engajada e interessada dos cidadãos;
 
9. É por isso mesmo que a democracia exige uma atenção particular principalmente por parte da oposição democrática que tem que estar atenta aos sinais, muitas vezes, não perceptíveis, num primeiro instante, por todos;
 
10. Em apenas um ano de exercício de puder pela actual maioria, os sinais emitidos não são encorajadores e suscitam até alguma preocupação tendo em conta o que se espera de Cabo Verde no plano interno e no plano internacional;
 
11. Vamos aos sinais:
 
11.1. A tentativa de jogo de cartas marcadas em que os cidadãos são tratados não de acordo com os seus direitos ou com a sua competência mas sim de acordo com a sua preferência política ou partidária para os discriminar e coloca-los numa prateleira qualquer sem se preocupar com o desperdício dos recursos humanos e o aproveitamento de todos as capacidades nacionais, frutos de aturados e avultados recursos investidos nas pessoas;
 
11.2. As decisões tomadas enquanto Governo de gestão que perfeitamente poderiam aguardar o debate do Programa do Governo e a aprovação da Moção de Confiança;
 
11.3. A eliminação dos concursos públicos como a primeira e mais emblemática desta maioria;
 
11.4. A exoneração precipitada de Embaixadores para manter descobertas representações importantes, por mais de um ano, com consequências imprevisíveis e algumas já bem notórias;
 
11.5. A indicação de Embaixadores com base em critérios puramente partidários e como prêmios de campanha e com patrocínio ao mais alto nível;
 
11.6. A massiva substituição de administradores e gestores públicos, não poupando nem os gestores e directores das escolas e estabelecimentos de ensino normalmente escolhido com base em critérios objectivos e, não raras vezes, de acordo com a preferência dos próprios professores;
 
11.7. Os despedimentos na Administração Pública e nas Câmaras Municipais apenas por razões de ordem política;
 
11.8. Os desencontros entre o prometido e as respostas para as mais diversas questões destacadas como urgentes;
 
11.9. As nomeações assentes em critérios puramente partidários e de base puramente familiar na linha de um nepotismo clássico ao mesmo tempo que se levanta bem alto a bandeira da despartidarização para camuflar as práticas vergonhosas;
 
11.10. Os atentados à liberdade de imprensa com acções descaradas e despudoradas de interferência e de manipulação dos órgãos públicos da comunicação social;
 
11.11. A ofensa aos jornalistas e outros profissionais da Comunicação Social agora catalogados de conservadores e não dados à inovação;
 
11.12. A tendência em não partilhar informações estratégicas e outras informações que se enquadram no âmbito da prestação de contas;
 
11.13. O baixar de guarda no cumprimento da Constituição da República e de outras Leis pondo em causa o Estado de Direito Democrático, questão fundamental para um país que abraçou a sério os valores constitucionais;
 
11.14. A ausência premeditada do Primeiro Ministro no Parlamento;
 
11.15. A degradação da situação mesmo no Parlamento onde se violou a Constituição, com o Presidente da República, em funções, a presidir os trabalhos desta Casa, se viola de forma descarada e com a anuência intencional de toda a maioria, o Regimento da Assembleia Nacional, pondo em crise as regras de jogo democrático e as normas de funcionamento da Casa do Povo;
 
11.16. A interferência excessiva dos membros do Governo na condução dos trabalhos parlamentares com cumplicidade evidente do Grupo parlamentar do partido ventoinha;
 
11.17. Aqui no Parlamento a situação é de longe mais grave porque, enquanto Casa da Democracia, deveria ser o espaço privilegiado de fazer pedagogia e o centro emissor de exemplos que encorajassem as outras instituições e o próprio povo;
 
11.18. Já não se garantem os direitos dos Deputados, não se permite a participação nas reuniões das Comissões Especializadas, designadamente, nas audições que contam com tentativas claras do seu condicionamento patrocinados até pela mais alta figura desta Casa.
 
12. Todos estes factos fragilizam claramente a nossa Democracia e chamam a atenção de todos no sentido de tomar medidas adequadas para garantir a caminhada ascendente para a intensificação e para a consolidação da democracia neste Chão fecundo;
 
13. Colocamos um conjunto de questões e esperamos que o Governo e a maioria que o sustenta, respondam de forma clara e objectiva sem subterfúgios e sem desvios a bem deste recurso estratégico.
 
Assim, Senhor Presidente, é neste contexto que, a luz do Regimento da Assembleia Nacional, introduzimos esta Interpelação ao Governo sobre “A Democracia e a Transparência em Cabo Verde” colocando as seguintes questões com o objectivo de provocar um debate sadio e frutífero entre os sujeitos parlamentares com assento nesta Casa do Povo:
 
1. Neste um ano de governação da actual maioria que medidas foram tomadas já para aumentar e aperfeiçoar os mecanismos de transparência na governação do país?
 
2. Que avaliação se pode fazer do impacto da eliminação dos concursos para acesso a cargos públicos?
 
3. Quantas nomeações já foram feitas neste período de governação e quais os serviços e instituições abrangidos?
 
4. Quais os reais vencimentos praticados nos cargos recém dotados?
 
5. Que contractos foram já assumidos pelo actual Governo com impactos na vida das pessoas?
 
Praia, 25 de Abril de 2017

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