Dia da Hora Grande, já indagado em 1962 pelo poeta e visionário político, Onésimo Silveira.
Daí que se destaca em relação a todo os outros dias porque, afinal, simboliza o fim de uma épica luta durante séculos de estruturação paulatina da nossa identidade política e de décadas de uma luta de libertação nacional, que exigiu enormes entregas e grandes sacrifícios que são marcos indeléveis da nossa História enquanto Povo e Nação, para início de uma nova aurora.
Sabemos muito bem o quanto custou termos chegado, finalmente, a 5 de Julho de 1975, para aclamarmos a nossa identidade e dignidade de povo, depois de séculos de resistência a múltiplas dificuldades, impostas por situações naturais adversas e um regime político insensível e ineficaz.
Independência é um momento alto e grandioso da vida de um povo que merece ser exaltado, ser lembrado e ser comemorado, para render homenagem a uma gesta heroica protagonizada por aqueles que, sem olhar a riscos e desafios, deram corpo a sonhos reprimidos, fizeram ecoar vozes silenciadas e conseguiram regar, com o seu suor e sangue, o chão da esperança, e despertar uma nova certeza, a certeza de um poema diferente para o povo das ilhas.
Sim, Cabo Verde teve a sorte de gerar, no seu seio, homens e mulheres valorosos que souberam interpretar o sonho acalentado por várias gerações, o sonho de ser livre, o sonho de ser senhor do seu destino, o sonho de viver longe das ameaças das secas cíclicas, das fomes tenebrosas e das mortes anunciadas. Enfim, o sonho de deixar de ser os flagelados do vento leste.
Sim, Cabo Verde gerou, no seu ventre, mulheres e homens que desafiaram a morte e passaram do pensamento à ação e fizeram um casamento perfeito entre eles, cada um alimentando o outro, no momento em que um manifestasse sinais de debilidades ou que cada um precisasse da sinergia do outro.
Sim, tivemos estes homens e mulheres valorosos, que escreveram com letras de ouro páginas e mais páginas de história, a PÁGINA mais bela da nossa história, a página da independência nacional.
Com efeito ninguém consegue negar os feitos dos quantos irmãos se entregaram nas frentes da luta armada e da luta política clandestina, privando-se da família, de uma carreira materialmente gratificante, para contrariarem os absurdos do colonialismo e do fascismo, para assim ficarem do lado dos princípios e valores universais que dominaram as vagas das forças progressistas da Humanidade durante o século XX.
Estamos, aqui, para dizer que valeu a pena o sacrifício consentido e que estamos disponíveis para pegar o facho e continuar a dar sentido a 5 de julho e a dar conteúdo à independência, enquanto mais um ponto de partida, não obstante ser uma meta fundamental na caminhada deste povo heroico.
A honestidade e o dever de memória nos mandam dizer que todos os países têm a sua própria história e que toda a história tem os seus protagonistas, homens reais, de carne e osso, mas que se distinguiram pela sua coragem, pela sua ousadia, pela sua visão e pela sua atitude de entrega sem limites.
Neste momento, devemos lembrar Amílcar Cabral que, sem poder ver a independência, acreditou nela como mais ninguém, e conseguiu, mesmo depois do seu desaparecimento físico, manter mobilizado um povo inteiro para a causa maior.
Amílcar Cabral destaca-se pela sua capacidade estratégica, pela sua liderança, pela sua perseverança e pela sua capacidade de convencer e mobilizar o outro e, graças a isso, dirigiu uma das mais bem-sucedidas lutas de libertação nacional.
Há outros, também, que já partiram como Aristides Pereira e Abílio Duarte, que conquistaram lugares merecidos na galeria dos filhos ilustres da Terra.
Mas há outros, também, que vivem entre nós como Pedro Pires e há outros ainda, cidadãos anónimos, mas que foram distintos discípulos de Cabral e conseguiram dar continuidade, nos campos de batalha ou nas frentes clandestinas, à gesta libertária, participando ativamente nos processos que conduziram à independência da Guiné e Cabo Verde e lançaram as bases e as sementes fecundas da reconstrução nacional.
Rendamos pois, sem complexos, uma justa e merecida homenagem aos combatentes da liberdade da pátria, estes dignos filhos da Terra que marcaram uma época e traçaram um novo rumo para estas ilhas atlânticas.
Como temos afirmado, após o 5 de Julho de 1975, a independência nacional consolida-se todos os dias, na afirmação contínua do profundo orgulho de termos nascido cabo-verdianos, na confrontação assertiva com desafios próprios da época.
Comemorar o 5 de julho é o momento para uma reflexão profunda sobre o caminho percorrido, sobre as conquistas alcançadas, sobre os obstáculos ultrapassados, sobre os desafios enfrentados ou a enfrentar e, sobretudo, sobre os novos rumos a dar ao país.
• Senhor Presidente da República
• Senhor Presidente da Assembleia Nacional
• Senhoras e Senhores membros do Governo
• Senhoras e Senhores Deputados da Nação
• Senhor Presidente do Tribunal Constitucional
• Senhor Presidente do Supremo Tribunal
• Senhor Procurador da República
• Senhoras e Senhores Deputados
Todos os dias estamos obrigados a reafirmar a nossa independência e isso só é possível fazer-se com a reafirmação da nossa soberania de ação e de pensamento, com a reafirmação do patriotismo, com a reafirmação do orgulho nacional, com a reafirmação dos valores fundamentais para uma Nação, como a liberdade, a democracia e o Estado de Direito, e com a garantia da realização da Constituição, enquanto Lei Fundamental, garantindo às pessoas condições para viverem como cidadãos por inteiro.
Reafirmar a independência é não se silenciar perante factos graves que ocorrem no país, que preocupam e apoquentam as pessoas no seu dia-a-dia, e este é o momento de lembrarmos alguns acontecimentos que preocupam a todos, sem exceção.
Temos vindo a assistir à perda de vidas humanas, tão simplesmente porque às pessoas não é prestado socorro a tempo ou em condições de segurança minimamente dignas, pondo em causa um dos direitos básicos e elementares, que é o direito à vida.
A situação torna-se mais complicada quando o Governo que é o principal responsável para garantir a materialização, na prática, destes direitos, procura desresponsabilizar-se e passar a culpa para aqueles que denunciam estes verdadeiros atentados aos direitos dos cidadãos. Em casos como os ultimamente verificados, uma simples declaração de que o problema vai ser resolvido, não basta! A gravidade da situação brada aos céus, é da maior desumanidade, merecendo a maior reprovação da sociedade, que exige a prestação de contas e que crimes dessa natureza sejam punidos e não voltem a acontecer no nosso país.
Mais uma vez, o PAICV repudia veementemente tais desfaçadas violações dos Direitos Humanos e solidariza-se com as famílias enlutadas nesta hora de profunda dor e de grande revolta.
• Senhoras e Senhores Deputados!
• Minhas Senhoras e Meus Senhores
Reafirmar a independência é, também, não esconder a realidade e, sim, agir sobre ela e procurar melhorá-la ou mudá-la e a situação da segurança é uma daquelas que precisa de uma atenção particular.
Reiteramos que a questão da segurança e tranquilidade públicas, pelos seus contornos, pela sua gravidade e pela sua complexidade, está cada vez mais preocupante, pois, enquanto através dos órgãos de comunicação social pública as autoridades nos fazem um rosário de grandes melhorias, as redes sociais e a vivência quotidiana do cidadão nos dão conta, diariamente, tanto de homicídios, como de crimes, que vão desde assaltos a domicílio, agressões físicas e à pequena criminalidade. Bem hajam as redes sociais,pois, caso contrário, a criminalidade que se vive no país, cairia no desconhecimento total.
Preocupa-nos viver um ambiente social em que não sabemos a que horas a nossa casa é violada, em que momento podemos ser assaltados violentamente nas ruas, em que receamos que os nossos filhos sejam raptados para nunca mais haver notícias sobre o seu paradeiro e quem são os criminosos, ou ainda, porque somos constantemente perturbados pelos distúrbios ruidosos que não respeitam o direito de descanso depois do trabalho.
Reafirmar a independência é também reafirmar todas as liberdades, lutar para a sua qualificação, batalhar para uma imprensa cada vez mais livre, liberta de tentações de censura, manipulação ou instrumentalização, lutar para a defesa e materialização da Constituição e deixar a nossa democracia, se intensificar, florir e frutificar.
Reafirmar a independência é contribuir, todos os dias, para a revalorização deste pequeno país no plano externo, com uma diplomacia inteligente, ousada e eficiente que tenha em conta uma já larga experiência vivida, com ganhos extraordinários na credibilização desta Terra.
A nossa política externa, claramente, continua padecendo de vitalidade, não está conhecendo o vigor de que tanto necessita Cabo Verde, na tradição da qualidade das suas posições e pelos contributos que dispensou às relações entre Estados, tanto nas relações bilaterais, como junto das organizações internacionais.
São já vários os desencontros, os desacertos e as desafinações, que põem a nu algum desnorte, na gestão de dossiers sensíveis com perdas importantes para a credibilidade do país e com sinais de erosão profunda na imagem externa destas ilhas. A agravar, denota-se uma total falta de abertura, por parte do Governo, para o salutar diálogo que deveria existir entre os sujeitos políticos e mesmo com a sociedade.
É nossa opinião que devemos retomar, com uma outra dinâmica e com uma outra atitude, as relações com nosso continente, a África e as respetivas organizações, já que se trata de espaços políticos e económicos onde nos encontramos inseridos, por excelência. Trata-se de uma questão tanto de sentimento de pertença, como também, de estratégia, face aos sinais, nada encorajadores, a que vimos assistindo um pouco pelos tradicionais grandes espaços geoeconómicos.
No plano económico e social, há também correções e afinações a serem feitas. Se o próprio povo tem a perceção que o caminho escolhido está errado, não nos resta outra saída senão corrigir o erro e acertar o passo. Voltamos a alertar para a forma atabalhoada como vêm sendo encarados os efeitos da seca que assola o país, com grave empobrecimento de milhares de agricultores e criadores de gado. Continua-se a insistir que há uma boa gestão dos recursos, quando, na verdade, há agravamento da carência de água para consumo, são animais domésticos a debilitarem ou a morrerem, é a produção agrícola a reduzir dada a crescente escassez de água para a rega, sem falar no aumento, a olhos vistos, de pessoas carenciadas, em quase todos os pontos do país.
O descaso é tanto que o Governo dá-se ao luxo de dizer que não precisamos de recursos da comunidade internacional, quando é a própria FAO a considerar que o ano agrícola foi mau e que as condições de vida no meio rural são muito preocupantes. Desejamos que a época das chuvas, que se avizinha, traga boas águas para, assim, vermos diminuídos os sofrimentos dos que vivem da exploração agrícola e da pecuária.
Neste plano, não podemos deixar de solicitar ao Governo que cumpra o prometido no que respeita as tarifas de água e luz, que durante as campanhas eleitorais tanto badalou que eram as mais elevadas do mundo. Afinal, assistimos ao seu aumento, seguido do anúncio da privatização da ELECTRA, como se essa fosse prioridade nacional, quando ainda temos, na nossa memória, o quanto de mal fez aos consumidores.
Insistimos junto do Governo para que cumpra o seu dever constitucional, institucional e ético, de prestar à oposição democrática, as informações sobre todos os negócios públicos com particular destaque para os que levaram a liquidação dos TACV do mercado doméstico e á entrada da BINTER, bem como as operações complicadas com os TACV no mercado internacional, pois, não são matéria da sua exclusividade. Não podemos quedar-nos a ouvir informações que não se cruzam, muitas vezes pondo em causa a credibilidade da governação do país.
• Senhor Presidente da República
• Senhor Presidente da Assembleia Nacional
• Senhoras e Senhores membros do Governo
• Senhoras e Senhores Deputados da Nação
• Senhor Presidente do Tribunal Constitucional
• Senhor Presidente do Supremo Tribunal
• Senhor Procurador da República
• Senhoras e Senhores Deputados
• Caras cabo-verdianas
• Caros cabo-verdianos
Reafirmar a independência é também cuidar da dimensão simbólica do nosso percurso o que implica honrar a memória daqueles que pagaram com a sua própria vida o preço da nossa liberdade, como é o caso do Herói fundador da nossa nacionalidade, Amílcar Cabral.
Assim, não podíamos, nem devíamos deixar passar em branco, a nossa grande preocupação quanto às intenções do Governo em relação ao Memorial Amílcar Cabral, sítio de memória material de grande simbolismo histórico da Nação Cabo-Verdiana. A questão que se coloca é que AMÍLCAR CABRAL é o maior sujeito da nossa História, a maior referência da heroica luta pela nossa dignidade e afirmação como Povo, como Nação e como Estado.
AMÍLCAR CABRAL simboliza o melhor do nosso sentimento de pertença e os mais nobres ideais que enformam a identidade do nosso imaginário e da nossa memória coletiva. Daí que tudo o que tenha a ver direta ou indiretamente com figura da nossa história, que é um património de todos os cabo-verdianos, seja matéria de Estado a ser devidamente ponderada e tratada entre as instituições do Estado, onde devem ser incluídas altos signatários que com ele privaram e escrevam a prestigiada história da luta de libertação nacional.
Isto é, esta matéria não é privilégio, nem exclusividade do Gabinete do Governo nem da Câmara Municipal, pelo que exigimos que o tratamento do assunto com os seus eventuais interesses em causa, seja partilhado e refletido pelas forças vivas da Nação.
Aproveitamos ainda neste item, para manifestarmos o nosso desagrado pela forma pouco correta como certas instituições reagiram ao anunciado tratamento do espólio documental de AMÍLCAR CABRAL pela UNESCO, o que revela um desvio grave ao comedimento, humildade e sentido de Estado que devem pautar a conduta de altos representantes de Estado na abordagem das memórias que encerram o fundamento da nossa Nação.
E nesse pressuposto apelamos a que seja conferida a meritória dignidade que é devida aos Combatentes da Liberdade da Pátria, não somente em momentos simbólicos como este, mas também na materialização de todos os direitos que a lei lhes confere.
• Minhas Senhoras e Meus Senhores!
Reafirmar a independência é valorizar os 43 anos como país independente e ter em conta que o caminho a percorrer ainda é muito mais longo, quiçá mais difícil para se poder consolidar, definitivamente, os baluartes da Nação.
Reafirmar a independência é também ter a consciência clara de que a independência nacional não foi uma dádiva ou uma doação mas sim fruto de uma luta de sacrifícios e desafios com protagonistas concretos e reais e portanto com referências que engrandecem a Nação.
Só seremos GRANDES se soubermos valorizar o nosso percurso enquanto povo e enquanto Nação. Somos grandes porque somos uma comunidade de indivíduos que partilham o mesmo território, com a mesma origem, com um passado cultural e histórico expresso na mesma língua, nas mesmas tradições, nos mesmos costumes, e que como povo, num dado momento constituímos a nossa Nação. Inconformados com a opressão, nos unimos, lutamos e proclamamos a nossa Independência Nacional para nos vincularmos ao Estado de Cabo Verde e assim partilharmos as mesmas instituições com leis próprias, sob a direção de uma administração, formando assim uma entidade política nacional.
Senhoras e Senhores Deputados!
Caros compatriotas!
Cabo Verde é um Estado consolidado que demonstrou já ter alicerces seguros para enfrentar adversidades múltiplas e aguentar-se de pé o que só acontece por estar estribado na tenaz vontade de um povo que nasceu para vencer porque temperado nas dificuldades impostas pela natureza, muitas vezes chamada de madrasta e pelas duras condições humanas a que foi sujeitado.
Assim queria aproveitar este momento para endereçar um abraço solidário, de amizade e de homens e mulheres livres residentes nestas ilhas e também espalhados pelo mundo.
Este abraço é também um abraço de reconforto pelas dificuldades enfrentadas e de esperança por dias mais afortunados porque não pararemos de lutar para enfrentar e vencer os desafios de hoje e os vindouros.
Viva Cabo Verde, livre e independente!